DIÁLOGO – SÓCRATES E O MÉTODO DIALÉTICO


O método dialético de Sócrates é caracterizado pelo confronto de ideias e argumentos, tendo como principal finalidade a desconstrução da opinião (falso saber) para a reconstrução (Maiêutica) de um novo saber. Os diálogos socráticos iniciavam basicamente parecendo não querer ensinar nada a ninguém. Ao contrário, ele costuma expressar-se como quem deseja aprender com seu interlocutor, fazendo-lhe perguntas como se nada soubesse.

Exemplo: Diálogo Eutífron ou religiosidade
O tema da discussão é sobre a Piedade. O problema levantado seria sobre a natureza da Piedade, já que Eutífron, acusante do pai, alega conhecer o que agrada e desagradam os deuses.
Sócrates: É evidente que a vítima de teu pai é um de teus parentes, pois não acusarias teu pai de homicídio para defender um estranho?
Eutífron: Faz-me rir Sócrates! Acreditas que eu deva distinguir um estranho de um parente no que diz respeito à vítima? A vileza é a mesma, além disso, a vítima era um servo que sob o efeito da embriaguez, irritou-se contra outro servo e o degolou. Meu pai, então, ordenou que lhe atassem pés e mãos, atirando-o em um fosso até a chegada do juiz. Enquanto isso se esqueceu do prisioneiro, largando-o a sua própria sorte, que morreu de frio e fome. É evidente que tanto meus pais quanto os parentes estão revoltados pelo fato de que eu esteja acusando meu pai. Alegam que ele não o matou, e que, mesmo supondo-se que o tivesse feito como a vítima matara outro homem, seria lícito que o castigassem. Afirmam que é cruel um filho acusar o pai, mas mal sabem eles, Sócrates, o que é piedoso ou cruel aos olhos dos deuses.
Sócrates: Se julgas conhecer tão bem e com tanta precisão a opinião dos deuses a respeito do que é piedoso, então, gostaria de tornar-me teu aluno, assim quem sabe consigo me livrar da minha acusação.
Eutífron: Assim Sócrates, eu não teria utilidade alguma e eu não me distinguiria dos demais homens comuns se não soubesse essas coisas.
Com habilidade de raciocínio, Sócrates conduz o diálogo através de perguntas que evidenciam contradições e problemas que surgem a cada resposta do interlocutor. Desse modo, o filósofo vai desconstruindo a concepção inicialmente apresentada, como também a postura arrogante e presunçosa do interlocutor. Nesta fase do diálogo chamamos de REFUTAÇÃO ou IRONIA.
Sócrates: Explica-me, então, o que consideras piedoso e impiedoso?
Eutífron: Digo que piedoso é isso mesmo que farei acusando meu pai de homicídio. A piedade impõe o castigo do culpado, seja este pai, mãe ou outra pessoa. Agir de outra forma é errado e contra os deuses.
Sócrates: Crês, por acaso, que entre os deuses sucedem guerras, horríveis inimizades, lutas e discórdias?
Eutífron: Não somente isso, Sócrates, mas muito mais coisas.
Sócrates: Mas recordas que te pedi para demonstrar a natureza de todas as coisas piedosas e não uma ou duas coisas dessas.
Eutífron: Se é isso o que queres, farei imediatamente, pois é piedoso tudo aquilo que é agradável aos deuses, e impiedoso o que os desagradam.
Sócrates: Se o piedoso e o impiedoso são coisas completamente diferentes, sendo coisas que se opõem entre si, e os deuses, como anteriormente afirmastes, também lutam entre si devido discórdias podendo até se detestar, não haveria, portanto, divergências entre eles quanto ao justo, o belo, o que é bom ou mau?
Eutífron: Teu raciocínio é correto.
Para Sócrates a primeira virtude do sábio é a consciência de sua ignorância, portanto, Sócrates busca através do reconhecimento do próprio interlocutor que sua concepção inicial é um falso saber. Com isso Sócrates pretende libertar do orgulho e da pretensão de que tudo sabe para reconstruir um novo saber. Essa fase é conhecida por Maiêutica (parto de ideias) o interlocutor por meio de uma série de perguntas levantadas por Sócrates conseguiria concluir por si só (dar à luz) uma nova concepção do problema. 
Sócrates: Então, estimado amigo, não respondeste à minha pergunta. Pois eu te pedi que me explicasse o que faz todas as coisas piedosas serem piedosas e as impiedosas serem impiedosas. Porém vimos que o que agrada a alguns deuses pode desagradar a outros; portanto, querido Eutífron, não seria de espantar que aquilo que fazes ao acusar teu pai fosse agradável para um deus, mas detestável para outro.

Eutífron: Acredito, contudo, Sócrates que a respeito disto não exista divergências entre os deuses.
Sócrates: Então, me diga que prova possui de que todos os deuses concordem referentes a este caso, pois um servo que cometera um homicídio e que acorrentado pelo dono da vítima, morreu justamente em decorrência de ter sido acorrentado antes que aquele que o prendera pudesse saber o que fazer com ele. Se me forneceres uma prova satisfatória, jamais pararei de enaltecer teu saber.
Eutífron: Talvez isso não seja possível neste momento, Sócrates, apesar de achar que eu possa fazer.
Sócrates: Estimado amigo, raciocina sobre isto: o que é piedoso tem a aprovação dos deuses pelo fato de ser piedoso, ou é piedoso por ter a aprovação dos deuses? O que é amado não é diferente do que ama?
Eutífron: Não sei o que pretendes?
Sócrates: Parece-me que não é por ser um objeto amado que sentem amor por ele os que amam, ma pelo fato de ser amado é que realmente se o ama. Aplicaremos ao piedoso então, pois acredito que é uma única coisa o que é amado pelos deuses e o que é piedoso. Logo, se o que é piedoso é amado por ser piedoso também o que é amado o é por seu próprio caráter; portanto, se o que é amado pelos deuses o é porque é amado, da mesma maneira o que é piedoso o é porque é amado. (...).
 
(...).






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